A realidade contemporânea em “Que Horas Ela Volta?”

By Isabella Jarrusso - terça-feira, novembro 10, 2015


Contém Spoilers 

Com direção de Anna Muylaert, o filme Que Horas Ela Volta? (2015) é uma mistura de comédia com critica social, que vem ganhando reconhecimento nacional e internacional ao ser premiado nos festivais de Sundance e Berlim. Este reconhecimento não é só da critica especializada, mas também do público em todo o mundo, tornando o longa já como favorito para a indicação final ao Oscar 2016.

O filme foca em Val, interpretando com resplandecência por Regina Casé, uma nordestina que deixou sua filha em Pernambuco, para conseguir uma vida financeiramente melhor em São Paulo. Val trabalha para uma família numa mansão no Morumbi, onde além de ser empregada doméstica também é a babá de Fabinho (Michel Joelsas), o filho de seus patrões.

Anos depois, ela recebe um telefonema de sua filha Jéssica (Camila Márdila), pedindo ajuda para vir à São Paulo para prestar  vestibular. Como Val mora no trabalho, ela pede para os seus patrões Bárbara (Karine Teles) e Carlos (Lourenço Mutarelli) se sua filha pode passar um tempo na mansão, e eles aceitam a garota de braços abertos. Mas isso durou bem pouco, quando Jéssica mostrou ser um “problema” para alguns moradores, mais especificamente para Bárbara.

No primeiro momento o que parecia ser o problema, era a relação abalada entre Val e a filha por causa do abandono na infância. Mas o real conflito começa quando Jéssica chega à mansão e mostra ter um comportamento “inaceitável” na visão de Bárbara, que seria a quebra de regras das classes sociais e é neste momento que é adquirido a visibilidade da permanência na hierarquia social entre patrões e empregados.


Jéssica pode ser vista como a causa de uma revolução. Ela não aceita ou entende o porquê da mãe levar uma vida em posição ínfera na mansão. A garota não se deixa ser submissa como a mãe. Ela vai conquistando os lugares da casa que são proibidos aos empregados. Jéssica age com espontaneidade ao jantar com os patrões, entrar na piscina e dormir no quarto de hóspedes. Deixando Bárbara enfurecida com as atitudes e Val sem entender o atrevimento (maravilhoso) da garota.


A brilhante ideia de Muylaert em mostrar a desigualdade social escancarada e ao mesmo tempo sutil com ações do cotidiano dessas famílias de classe média, que tentam mostrar um relacionamento saudável com os seus empregados ao dizer “Você é quase um membro da família” ou os pais que trabalham o tempo todo e deixam seus filhos pequenos com babá. Nesse ponto que compreendemos o nome do filme, que já na introdução, o ainda pequeno Fabinho pergunta que horas sua mãe vai chegar e como ele passava o maior parte do tempo com Val, criou-se um grande vínculo maternal entre Val e Fabinho, até a adolescência do garoto.

A visão inteira do filme pertence a Val. Muitas são as cenas em que a câmera mostra os cômodos da casa, referindo que Val é aquela que habita todos os cantos da mansão, mesmo não evidentemente estando em cena.


 Esse protagonismo fica mais forte pelo os planos em que ela está na cozinha e é chamada diversas vezes pelos patrões, ela entra e sai da cozinha, enquanto nós continuamos no local só observando ela buscar os pratos, recolhendo, levando sobremesa e nesses momentos só vemos a família por segundos pela uma fresta da porta da cozinha.

Nas cenas finais do filme, Val se rebela, saindo da passividade ao entrar na piscina da mansão. Na qual foi esvaziada por ordem de Bárbara, após Jéssica ter nadado com Fabinho, e então de um lado cômico e emocionante, Val entra em uma piscina com a água bem rasa, simbolizando a liberdade que tinha conquistado junto com a filha.

De modo poético, o roteiro de “Que Horas Ela Volta?” mostrou ser um filme que visibiliza a realidade da sociedade contemporânea brasileira, que é totalmente preconceituosa e que ainda sujeita em tratar o outro com inferioridade mesquinha causada pela a desigualdade econômica. É um filme de importância cinematográfica nacional e, claramente, social. 

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